Posted by : Charlie S. Dias sábado, 16 de março de 2019



Venho por este meio estrear a rubrica “Trivialidades do quotidiano”, cuja sobrevivência e crescimento dependerão da nossa linda e diversificada comunidade em ação, e da sorte ou azar de me ter cruzado com situações que me mereçam destaque. Testemunhos in loco. Depreende-se que, para isso, tenha de sair de casa. Portanto, nada de expectativas, não se esperam grandes novidades.
Esta rubrica terá como objetivo descrever, analisar ou julgar, de forma extremamente desinteressada, episódios da bela vida em sociedade. Gente mais grosseira resumiria isto a: Avaliar os macacos na selva.




Experimento nº 1 – Abaixo o rádio aos altos gritos



Autocarros urbanos... Haverá melhor sítio para encontrar comportamentos impulsivos ou inusitados? Ainda para mais se for logo de manhã pela fresquinha, altura em que a rabugem e o stress para chegar a horas melhor coabitam, enquanto se tentam esconder atrás das olheiras. Só que é complicado, porque, por mais que as olheiras possam ser grandes, o stress e a rabugice em conjunto podem facilmente tornar-se ainda maiores, e não dá para esconder algo atrás de uma coisa mais pequena.

Seguia no autocarro e, por mais de metade do caminho, até pensei que seria mais uma daquelas vezes em que nada acontece, só que enganei-me.
A dada altura, o autocarro passa uma paragem sem largar ou receber qualquer passageiro. Um velhote percorre o corredor e aproxima-se da motorista: ao que parece, desejava ter saído na paragem anterior, mas ela tinha continuado porque ninguém tinha carregado no botão do stop. E, outra vez ao que parece, quando se apercebeu da situação, o homenzinho tinha-lhe pedido se ela lhe podia abrir a porta, lá do longe...
Pediu-lhe então (outra vez?) se podia sair.
Ela respondeu-lhe que já não podia parar naquele momento, ali no meio da estrada. Foi então que veio aquele gostinho a manhã de (ainda!!) quarta-feira. Espero que a minha memória não me atraiçoe, mas foi parecido com isto:

Ele: Pois, anda aí com o rádio aos altos gritos, depois não ouve nada.
Ela: O senhor não tocou, se tivesse tocado eu tinha visto. Quando as pessoas tocam a campainha eu páro na estação seguinte.
Ele: Pois, aí com o rádio aos altos gritos... Está bem que eu também me esqueci de carregar no botão, mas... – enquanto se ia afastando, voltando ao seu lugar.

Como assim, não pode fazer o jeitinho de imobilizar o veículo e a restante via pública para evitar que eu tenha de andar mais 300 metros desde a próxima paragem para corrigir a minha pequena negligência!? Tempo é dinheiro. Se Usain Bolt que é Usain Bolt demoraria quase 29 segundos a correr essa distância, então imagine um velhote como aquele a andar, cansado e psicologicamente abalado por aquele assalto que acabara de sofrer.

Em defesa da senhora, tenho a dizer que também não ouvi o homem a pedir nada. Em defesa do senhor: eu também sou assim um bocado para o mouco, portanto...! Também acontece que estava muito perto ali das colunas a sacudirem-se (bumpz bumpz bumpz bumpz), e além disso, ainda por cima, também andava meio distraído nessa manhã, que até quase me esquecia de carregar na campainha antes de chegar ao meu destino.

Andam aí com o rádio aos altos gritos e depois nem ouvem os clientes...”.
Tenho ideia que também sou capaz de ter murmurado por uma sandes de mortadela, e aquela malvada, nada...
 “É assim que vai este país. É por isto que este país não anda.”.
Portugal é o país que não anda, mas onde os autocarros só andam, já nem páram.

Uma pessoa já não pode estar distraída descansadamente enquanto vai em viagem. Já para não falar nos tais botões para tocar a tal campainha, espalhados pela camioneta toda, todos vermelhos. Que depois ativam o letreiro do STOP a piscar, lá bem no alto para toda a gente ver, também a vermelho. Mas para quê tanto exagero? Realmente, não ser percebe.

Eu cá não sei de nada... mas tenho as minhas suspeitas de que parte daquela indignação terá despoletado por não se estar a ouvir a M80. E um bocadinho por ninguém se ter ainda lembrado de criar a M60, também. Se for para ser ignorado, que seja por música a sério. 
E atenção que eu também sou daqueles que só vêem vantagens em que o rádio esteja desligado naquele contexto.

Muita gente poderá vir a tirar como moral desta história, que se deve estar sempre atento para não nos esquecermos de avisar o senhor chofer caso seja necessário parar em determinado ponto, ou até, talvez, que ser motorista de autocarro já não é um trabalho exclusivo a homens. Mas algo me diz que a moral que aquele senhor tirou desta história, foi que não se deve ouvir rádio enquanto se conduz.
Se conduzir, não beba. E se conduzir autocarros, não ouça rádio.




Charlie S. Dias

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